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Carreira Profissional – uma conversa sobre malas, ânimos e molas
Se as vidas não editadas pudessem testemunhar a razão de seu sucesso diriam que foi por terem tido 90% transpiração e 10% inspiração, nas coisas em que se meteram a fazer
Uma das experiências mais ricas que tive em minha carreira profissional foi a de ser gerente de Capital Humano, numa grande corporação nacional, mais especificamente de sua área de TI, com 4.200 funcionários. Durante minha estada à frente daquela área, pude acompanhar de perto a carreira de mais de 1.000 trainees, que ali ingressaram, no período entre 2011 e 2016.
Muitos procuravam-me pedindo dicas de ascensão profissional, orientação no trabalho, ou, para um simples desabafo da adaptação. Para todos, eu tinha alguns “conselhos”. Aí estão:
Desfaça as malas emocionais - Diga para si mesmo: “Eu vim para ficar. Aqui é o meu melhor lugar, no momento, para eu estar”.
Essa postura faz toda a diferença. Não ficar de malas feitas é deixar de viver na provisoriedade de uma partida iminente, viver suspirando pela carreira do outro, pela empresa do outro, pela vida do outro. Desfazer as malas emocionais é permitir-se gostar dos novos amigos, da cidade, da empresa e sua cultura organizacional que nela ingressou. E, porque não dizer, gostar de onde já chegou, fruto do esforço que empregou. É prestar atenção de como está sentindo o trabalho, no lugar de ficar esperando que numa lâmpada mágica apareça o sentido do trabalho. Pensar sobre o pensado, prestar atenção ao que de legal faz e do impacto do seu feito sobre o todo, mesmo que seja o carimbar de uma pilha de papeis, faz toda a diferença para um bom desfazer das malas.
Cultive o ânimo - O segundo conselho é até bíblico: “Tende bom ânimo”. Ora, se até Jesus disse que no mundo teríamos aflições, mas que era preciso coragem e ânimo para enfrentá-los. Como achar que a vida corporativa será uma valsa? Nada disso. É pedreira.
É dormir tarde e acordar cedo. É suor. Aliás, aliás, se as vidas não editadas pudessem testemunhar a razão de seu sucesso diriam que foi por terem tido 90% transpiração e 10% inspiração, nas coisas em que se meteram a fazer. Na vida, não há almoço grátis. Tem que ralar, suar, acordar cedo, esforçar-se. Superar-se e para isso precisa-se da chama do ânimo, e todo o dia. E de um ânimo alimentado por nós mesmos. Não se pode terceirizar nosso ânimo.
Para o gestor, para a política da empresa, para o colega de estação de trabalho. Nem tampouco para o próprio trabalho. Ânimo é determinação, chama interior, coragem, vontade de ser e fazer melhor, ânimo é pulsão de vida. Mais sabemos dele pelo seu antônimo, o desânimo. Esse é fácil e perceber no outro e em nós mesmos. Etimologicamente, a palavra “ânimo” deriva do latim: animus, que significa “alma”, “coragem” ou “mente”. Que tem sua raiz em ANE, que significa respirar. Então, no limite, ter ânimo é continuar respirando, mesmo quando todos ao seu lado já desistiram, e estão desanimados. Contudo, o ânimo é um estado de espírito muito frágil, precisa ser bem cultivado, protegido e estimulado.
Entende? Tem muita gente ao seu redor que vai roubar-lhe o ânimo, cuidado para não se infecionar pelo desânimo deles. Use os anticorpos emocionais da esperança, otimismo, misericórdia e compaixão para lidar com eles, sem excluí-los de teu redor, querendo viver numa bolha. Mas, sem deixar que eles retirem de ti seu fulgor. Cuidar de teu ânimo é uma tarefa tua, não a delegue. Justificar o desânimo pelo impacto dos outros em nós mesmos, é só uma forma de dizer que estamos nos tornando como eles. E saindo do jogo antes do minuto final.
Desenvolva Molas Comportamentais – Gosto de ver as molas em ação, na suspensão de um veículo, por exemplo. Quanto mais tranco elas levam, melhor desempenham seu papel. E, quando cessa o estresse, elas voltam à sua posição de origem. Criaram uma palavra para isso, chamada de resiliência. Prefiro chamá-la de molas comportamentais. Que nos dão ginga, flexibilidade, que nos fazem contorcionistas para sair de situações difíceis. Que nos fazem surfar na onda da mudança. E ver nas incertezas, possibilidades.
E nos limites, paciência para equacioná-los, ou para racionalmente lidar com eles. Fazer meditação, cultivar momentos de paz e oração, cantar, dançar, pedalar, caminhar, celebrar, desenvolver senso de gratidão, nutrir amizades, valorizar a família, ter hobbies, praticar esportes, participar de algum grupo social para se doar, são espaços de renovação de nossas molas comportamentais. São lugares que atuam nelas como o malho atua sobre o ferro em brasa, dando-lhe mais fortaleza. Paradoxalmente, o segredo de manter as molas funcionando direito passa por algum, ou mais de algum dos itens acima, muito mais do que pelo nosso próprio esforço.
Muitos desses trainees ainda se comunicam comigo. E, em nossas conversas, eles me dizem que ainda usam as três dicas: de desfazer as malas emocionais, de zelar com responsabilidade pelo ânimo deles e de cuidar em renovar as molas para que não se enrijeçam com o dia a dia. E que essas dicas de carreira ainda fazem toda a diferença nas suas vidas profissionais e até pessoais.
Que bom!
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